terça-feira, 20 de dezembro de 2011

"Quando éramos crianças"- 3º conto

Tenho muitas saudades de quando éramos criança, (nascidos em 1950, 1960 até1970).
3º - Conto. Continuação
Em 1968 ou 1969, veio à crise do golpe e junto a quebradeira de meu pai teve que mudarmos para o bairro logo próximo de São Mateus, para o Altos Passos, Rua Dom Viçoso com Rua Moraes de Castro. (Final do 2º conto)
A loja era logo de esquina, ao qual meu pai, instalou um açougue, a porta ficava bem na quina da esquina das Ruas, Dom Viçoso com Rua Moraes de Castro, era tipo grade de enrolar com visibilidade para dentro do açougue, que possuía um frízer/balcão de exposição das carnes. Uma câmara fria, feita de madeira de lei revestida por chapas de alumínio, na sua frente era igual a um armário, com as madeiras expostas, mas internamente eram revestidas de chapas de alumínio lisas, as costas ficavam aparente as chapas de alumínio, que pegavam toda altura da câmara fria, uns 2,50 metros, por 2,50 de largura, contendo quatro divisórias e oito portas frontais, duas portas em cada divisória.
 No final de ano, na data de natal, meu Irmão,  como bom artista que é, preparou umas marcas de sola de sapato nas folhas de alumínio nas costas da câmara fria, que com sua altura dava acesso a um alçapão do forro da loja, e me iludiu me dizendo que tinha sido o papai Noel que tinha ido lá e tinha feito aquelas marcas todas só para levar presentes para mim. Fiquei completamente maravilhado com este fato, que comprovava a letra da música de natal, que fala que ele não se esquecia de ninguém, aliás, esse é uns dos motivos que até hoje me motiva a manter essa tradição infantil e inocente em meus filhos, mas luto contra correntes poderosas que querem amadurecer meus filhos antes do tempo. Continuando minha descrição, em cima do frízer balcão, tinha uma balança de balcão, vários papéis grossos da cor cinza ao qual se enrolava os embrulhos de carnes envolvidos em plásticos que ficavam em contato com a carne, esses papelões eu acostumava capturar mosquitos e espremê-los entre este papelão, só para ver a marquinha de sangue deles no papelão.
 Dentro do açougue havia um espaço ao qual se trabalhava os cortes, uma mesa/tronco redonda, de madeira, de mais ou menos 1,20m de diâmetro, com quatro pezinhos. Era uma mesa pesada com uma espessura de 1,00m, uma verdadeira tora, pois aguentava cortes e pancadas de machadinha para cortes mais duros como as costelas de bois e porcos, rabos e desmembrar os quartos de bois, e que de vez enquanto eu brincava escondido, lógico, com as facas de meu pai, até que um belo dia, fui cortar a cabeça de um palito de fósforo, usando a machadinha afiadinha, segurei o palito com o dedo indicador esquerdo e desci a machadinha com a mão direita, tinha por volta de uns 6 anos, não senti dor, mas um grande susto, um frio na espinha, tinha acertado a ponta do palito de fósforo, mas também a ponta de meu dedo indicador, que ficou com a lasca pendurada e jorrando muito sangue. Na hora, fiquei desorientado e comecei a gritar. Naquele momento,  estava em casa com minha Irmã que ficou muito assustada, mas me levou-me para a Cotrel, hospital de emergência que fica a alguns metros do açougue, lá como tinha muito medo de agulhas, quase me borrei, as agulhadas doíam mais que a machadada assassina, mas a ponta de meu dedo colou, verdade que ficou meio insensível, mas colou.
A definição desta casa era, um cômodo comprido nos fundos do açougue, que começava com a sala, de frente para a Rua Dom Viçoso, e seguia paralelo ao fundo do açougue, um quarto, depois cozinha, área de serviço descoberta de mais ou menos uns 2,50m por 2,00m, onde separado do corpo da casa ficava um minúsculo banheiro com um vaso sanitário e coladinho com o banheiro um cercadinho de alvenaria que era nossa piscininha, e onde tomávamos banho com uma lata de 20 litros de banha vazia pendurada em um cabo de vassoura enviesado. Minhas irmãs dormiam na sala, eu e meu irmão dormíamos nos fundos do açougue, atrás da câmara fria, num sofazinho que se desdobrava e virava cama. Era tudo muito apertado, mas era, pelo menos para mim, muito divertido.
O banho com aquela lata, era uma festa, minha mãe sempre foi muito improvisada, arrumou um carretel de linha corrente, aquele da cor laranjada, e colocou no furo da lata de banho e na ponta tinha uma rolha cortada na espessura do carretel, que virou torneira do chuveiro, da bica d’água, que era proveniente de uma mistura de água quente, aquecida no fogão com água fria da torneira, tínhamos aquela medida certa para o banho, molhávamos e ensaboávamos, depois recebia o enxágue final, imagina a qualidade deste banho.
Na divisa desta área de serviço tínhamos um vizinho em condições melhores que a nossa, e um menino, mais ou menos de minha idade, que as vezes brincava comigo, Silvio Cezar, que era parente do um famoso cantor, Silvio Caldas, mas ele tinha espingarda de chumbinho, e nessa época fazíamos altas maldades com os pardaizinhos, que viravam seu alvo preferido, ficava meio comovido quando os via morto, pois meu pai possuía um pássaro preto que vivia solto em seu ombro pelo açougue, em sua cabeça e nunca fugia, era o mascote, todo mundo o admirava, até que um belo dia algum gatuno o pegou, isso me remetia aos pardais que o meu amigo eliminava, e fez me afastar dele, também, pelo medo da tal arma, que as vezes ele fazia mira em mim.
Minha fase de estudante começa aos cinco anos e meio, faço aniversário em junho, e inicie minha vida estudantil meio anos antes, fui fazer o pré-primário, ainda quando morávamos na Rua Luiz de Camões, no jardim de infância do Mariano Procópio, usávamos uma jardineira vermelha com camisas brancas, íamos do bairro São Mateus até o bairro Mariano Procópio de bondinho, e era uma festa, fazíamos altas traquinagens, era o ultimo ano do bonde em atividade, em 1969, fazíamos xixi nas canecas e jogávamos no povo na rua, quando não tínhamos água ou suco nas merendeiras, era uma farra só. 
No ano seguinte, 1970, já estávamos morando na Rua Dom Viçoso, iniciei minha vida estudantil no 1º ano do primário no escola estadual Fernando Lobo, perto da casa da Rua Luiz de Camões, e logo fui para a escola Estadual Duque de Caxias no ano seguinte. Na fase do Grupo Fernando Lobo, conheci um amigo que mais tarde viria a revê-lo, chamado Amarildo, brincávamos muito na escola, corria o pátio todo durante o recreio, das lembranças que carrego, era que eu gostava de brincar de cavalo no muro de guarda corpo do corredor da escola, ou então de escorregador nas curvas do dito muro, ele possuía um acabamento em cimento liso e fazia uma curva nos encontros com uma mureta de acabamento. Eu nunca fui muito ligado a cadernos e ao final do ano dei meu caderno para o tal do amigo Amarildo, que após uns 20 anos o reencontrei e ele me mostrou o tal caderno, tinhas uns garranchos danado, mas foi muito legal.
Na época de férias escolares de meus irmãos, desfrutadas em Santo Antonio do Chiador, ou simplesmente Chiador, minha mãe seguiu até lá e me apresentava para uma tia, Irmã de minha mãe, e logo em minha estreia, com uns três a quatro anos, fui para o terreiro de minha tia começar a brincar, enquanto minha mãe se confidenciava com minha tia, assuntos que não me diziam, e fiquei por muito tempo muito quieto, e logo minha mãe desconfiou e foi ver o que estava acontecendo, e se deparou com uma cena nada alegre, eu já estava com o nono pintinho na mão, prontinho para ser pendurado na cerca de arame farpado com bambu, tinha dando banho e torcido para secar, como se fosse um pano, estava tudo morto e a galinha louca de raiva em minha volta e eu mandando ela esperar que eu já ia cuidar dela também. Tomei um baita puxão de zorêia e um monte de palmadas. Fiquei com cara de bundão, tinha dado um banho legal, os bichinhos estavam todos muitos sujos e no final ainda tomei aquele esfrega. No final tive que ir para a casa de outra tia, já que aquela tinha ficado traumatizada comigo.
 Nestas férias fui ficar com minha madrinha de batismo, conhecidos como, Tio Lino e Tia Colina, eles não tinham filhos e eram muito cuidadosos comigo, tinham uma preocupação danada com minha independência, pois era acostumado a ficar muito sozinho, minha mãe, nesta época era revendedora de produtos da AVON, e sempre me deixava brincando aos cuidados de minha irmã,  que na verdade olhava muito pouco. Eu não tinha o hábito de informar aonde eu ia, o que ia fazer,  quando assustava e dava com minha falta, eu já estava na rua, brincando de bola, de carrinho ou  na casa de minha tia Altina, outra irmã de minha mãe, que morava perto de tia Colina.
O grande barato de interior, é o sistema de vigia, quando acontecia de minha tia começar a me chamar, logo, logo a vizinha gritava da janela de madeira de dentro de sua casa para a minha tia que estava também da sua janela a me chamar: ele está na Altina, ou, ele está na rua jogando bola com os meninos.
A casa de minha madrinha era separada pelo lote desta vizinha, da casa de minha outra tia, tia Altina, que abrigava nas férias, minha prima também de Juiz de Fora, e que se tornou minha companheira de brincadeiras por quatro a cinco anos,  a famosa Pipida. Lembro que brincávamos de cavalo nas duas muretinhas da varanda da casa de minha tia Altina, pegávamos os arreios de cavalos e assentávamos sobre eles na mureta arrumávamos chicotes e íamos para vários lugares imaginários. Tinha uma dispensa ao fundo da área de serviço, feito de madeira, com telhado de barro, em uma água, entrávamos para esta dispensa e fazíamos altos almoços, comidinhas, eu como sempre inventava as coisas mais diferentes possíveis. Certo dia, antes do horário de almoço, quando brincávamos de fazer comidinha, eu era o cozinheiro, fiz um foguinho no meio de pedras e coloquei uma lata de cera com água de torneira e piquei folhas de chuchu e deixei cozinhando, ao final fiz minha prima comer tudo e ainda achar gostoso. Tinha um amor platônico por esta prima, nesta época tinha muito ciúmes de qualquer primo que chegava para brincar conosco, não brigava, mas sacaneava a vontade quando me sentia lesado da sua atenção, e acredito ser uma das maldades este dia da comidinha, ela é mais nova era mais inocente e fazia tudo que eu mandava.
Minha tia , irmã mais nova de minha mãe, mãe da Pipida, era muito mais cuidadosa com a Pipida que minha mãe comigo, talvez por ela ser menina,  e por minha mãe ser muito rústica e prática, eu tinha uma certa inveja da relação tão afetiva entre minha tia e ela, ela era todo manhosa, uma gatinha, usava só ropinha limpinha e passadinha, usava calcinhas dengosinhas, toda arrumadinha.
Eu um menino meio largadão, num penteava os cabelos direito, num escovava os dentes todos os dias, só usava roupas de outros, andava descalço, sem cuecas, só de primeira.
Certa vez, logo que comecei a estudar no grupo, éramos obrigados a andar com um short de tergal azul escuro, com fecho em fechecler na braguilha, uma camisa de pano branca com o bolso silkado com o logotipo da escola, fechada por  botões, que nem sempre eram os mesmos, apertado para dar uma mijada, ao mesmo tempo apressado, para não perder tempo do recreio no banheiro, fechei minha fimose entre os trilhos do tal fechecler, Puxa que lovaril, nunca tinha experimentado um ardido tão grande, fui para na sala da coordenadora aos gritos e para piorar tive que deixar ela descer o tal fechecler, foi uma vergonha misturada com alívio, mas nunca mais descia tal flechecler, sempre descia o short inteiro para mijar.
Minha mãe tinha sido gerada e nascida na fazenda de meus avós, fazenda batizada de Itabira, que vinha dos pais de meus avós, como minha mãe era a penúltima de 16 irmãos da mesma mãe, e eu era o mais novo de minha mãe, minha avó, desta época, já era muito idosa e meu avô já era falecido, minha avó era diabética e possuía uma ferida enorme, uma iscaria, no tamanho de uma meia laranja, no seu tornozelo causado por um arranhão de um gato, que nunca se fechava e que era tratada por minhas tias,  pelas filhas de minha tia, já adultas, pois minha tia deve ser a quarta filha de minha avó. A ferida era tratada com camadas de pomadas brancas, pasta d’água, que tinham um cheiro inconfundível, eu as vezes assistia as limpezas e a execução de curativos com gases após as camadas de pomadas. Eu brincava muito com as caixas de remédios de minha avó, fazia as tais de carros, trens, casas e etc., sempre acompanhados de estradas recortadas em locais com lodo, que viravam gramados lindeiros as rodovias onde eram retirados o lodo, improvisava árvores feitas de galhos de árvores, pontes de pedaços de telhas e outras criações. Meus carrinhos de plásticos, eu já coloria as janelas com caneta big azul para improvisar isofilme e utilizava fios de piaçava como antenas moles, muito usadas em rádio amador, ficava muito chic.
Hoje, percebo o quanto que eu era detalhista, criativo e organizado com toda simplicidade que existia, mas não passava nada despercebido em minhas brincadeiras, quase sempre solitário, pelo nível de minhas exigências e de cuidado com os detalhes, poucas crianças tinham saco para se inserir neste meu mundo.  
Destas brincadeiras com carrinhos que eu brinquei até a idade de oito anos, quando já morava na Rua Padre Tiago, esquina com Avenida Independência, estas brincadeiras de carrinhos rolavam na casa de minha tia Apare e Zé , com os meus primos segundos, Gui, Xandi e Guto, filhos de minha prima Maria casada com A.Silva, nossas brincadeiras de carrinhos sempre comandas por mim, tinham pontes com águas em baixo, estradas recortadas sob medidas de duas larguras de um carrinho, casas e postos de gasolinas feitas de armaduras de bambus recheadas por barros, batidas de carros velhos cheios de jornais, que pegavam fogo de verdade e que no final eram apagados por moderno caminhão de bombeiro com jatos de água de verdade, era um show. As vezes tínhamos a companhia do Paul, filho do vizinho de minha tia. E em alguns momentos íamos para a casa das irmãs gêmeas, elas tinham um bugue fapinha, movido a gasolina, elas eram da pá virada, viviam de calcinha pela rua e nas nossas brincadeiras várias vezes descobrimos nossas diferenças.
Voltando as férias de Chiador, o meu jeito meio independente e solitário, as vezes não sabia dimensionar, pela idade, com apenas seis anos, as dimensões de meus atos, saí com uma vontade louca de ir para a fazenda onde minha mãe, nasceu. Nesta época pertencia a minha tia Altina, e era administrada pelos meus primos  filhos dela, e parti logo cedo para lá sem ao menos avisar a minha madrinha , a fazenda se localizava a uma distancia de mais ou menos 3,5 kilometros da sede do município de Chiador, para tanto iniciava-se com uma subida de mais ou menos 1,8 Km, passava por um plano, de mais ou menos, 800 metros, depois, uns 400 metros, de leve declive, até a divisa em porteira do pasto para a sede da fazenda, que se distanciava de uns 500 metros, fiz tudo isto sozinho, atravessando pastos cheios de vacas com bezerros novos e com chifres, sem medo, e lá peguei mentira para os primos dizendo que a tia sabia de minha ida.
Passei maior susto em minha tia, pois não tinha esse controle quando ficava em casa em Juiz de Fora, fiquei o dia inteiro sumido, minha tia já esta em pânico quando eu cheguei com o retireiro de leite a tarde. Passei o resto da semana de castigo, catando feijão ou um tabuleiro de arroz, todo dia na parte da manha, tudo isto sem compreender o porque daquela aflição toda, afinal não era acostumado com este monitoramento exagerado em meu entender de menino criado sozinho, coitada de minha madrinha! (Continua no 4º conto)

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